O título abaixo deste texto que extraí de outro diário de outro menino autista, Ruy, diz que os pais estacionam às vezes, entretanto, nós aqui, pais do Cássio, estacionamos sempre, porque é um direito adquirido e quem tiver algum questionamento que vá se informar devidamente.
O texto é interessante e muito esclarecedor!!!!
"Porque (as vezes) estaciono meu carro em vaga especial
Por Ronaldo Tiradentes
Outro dia uma professora municipal, deixou um recado ostensivo em
minha página no Facebook. Com alguns erros de português e muito
desconhecimento sobre autismo, a dita professora assim me advertiu:
“Ronaldo Tiradentes,gostaria que vc prestasse mais
atencao quando fosse estaciionar seu carro na escola do seu
filhote,,pois vc ESTACIONOU na vaga de deficiente FISICO,,.deficiente e
aquele que tem L I M I T C O E S F I S I C A S…….KUALKER SINDROME OU
DISTURBIO DE PERSONALIDADE NAO E DEFICIENTE.TUDO BEM???!!! VC DEVE DAR O
EXEMPLO….COMO EU TAMBEM…..E TODOS OS SERES QUE SE DIZEM HUMANOS
..VALEU!!!!OBRIGADA PELA ATENCAO”
Ao abrir minha página no Facebook e ler o recado atrevido, como bom
leonino que sou, meu sangue ferveu. O recado poderia ter sido deixado in
box (internamente), mas a professora queria mesmo era aparecer, exibir
“cultura e conhecimento”. De sopetão, mandei minha resposta dura:
“você é muito audaciosa de vir aqui em minha página
pessoal para querer me dar lição de moral. Quem é você ?? Quem você acha
que é para querer vir aqui de forma desrespeitosa querer me ofender ???
Eu não vou dar satisfação a você porque parei em vaga de deficiente.
Procure a direção da escola e questione as razões pelas quais eu parei
em vaga especial Sugiro também que procure o Manaustrans e pergunte
porque foi concedido ao meu filho autista o direito de ter o carro que
lhe conduz parado em vaga especial. Aliás, como professora, que imagino
que és, lamento que você não tenha estudado o suficiente para entender
as limitações de uma criança autista. Como sei que você é deficiente
intelectual, em breve darei a você licões para que aprendas a respeitar
os direitos de uma criança com deficiência e os constrangimentos
corriqueiros a que são submetidos os familiares. Vá estudar,
analfabeta!!!!!!!!!!!
Hoje, com a cabeça fria, reconheço que exagerei na resposta. Dias antes, passei com minha família, um constrangimento no Aeroporto do Galeão, também relatado aqui e sem nenhuma resposta da TAM. O Fale com o Presidente, disponível no site da empresa aérea, é só agá, puro marketing.
Ano passado, estava dentro de um taxi em Paris com meu filho autista.
Sem mais nem menos, o motorista que tinha um nariz enorme e cara de
árabe, passou a dar ataques de histerismo pelo fato do meu filho ter
encostado o joelho por trás do assento dele. Nunca vi tanta grosseria
com uma criança que sequer sabia o que estava acontecendo. Tive que ser
enérgico para repelir a falta de educação do motorista de táxi. Nesse
mesmo dia, outro francês empurrou o Ruyzinho pelo simples fato dele
(Ruyzinho) ter espichado o pescoço para ver o joguinho que o homem
manipulava no celular. Encontrei a Kiê chorando, quando voltei para
encontra-los numa pracinha de Paris.
Essas situações que humilham familiares de crianças especiais, são corriqueiras.
Temos que ter paciência de Jó para evitarmos permanentes atritos no meio da rua.
Voltando ao caso da professora da SEMED que deixou-me um recado
malcriado no Facebook. Prometi que daria esclarecimentos sobre as razões
que me levam a estacionar, em raríssimas ocasiões, em vagas destinadas a
pessoas com portadoras de deficiência.
É verdade que meu filho autista não tem dificuldade de locomoção. Ele
anda e corre muito bem. Por outro lado, não é verdade que meu filho
autista tenha desvio de personalidade com afirmou a professora
desinformada. Autismo, nem de longe é um desvio de personalidade.
Autismo é um transtorno do desenvolvimento que dificulta a interação
social da criança, atrasos na linguagem etc. Uma das principais
características do autismo é a hiperatividade, o que deixa a criança
muito agitada, impaciente. Na maioria dos casos, são necessários
remédios para deixar a criança mais calma. Meu filho toma Risperdal
todas as noites. Esta é uma tarefa minha. Dou a ele, meio comprimido
para que ele desacelere e durma tranquilo.
Segundo os especialistas, essa hiperatividade passa quando o autista chega na adolescência.
Outra característica do autista, é não ter noção de perigo. Se eu
deixar, o Ruyzinho atravessa a avenida Djalma Batista sem olhar para os
lados. Não tem ideia do que seja um atropelamento.
Já aconteceu comigo, em várias situações, de ao estacionar o carro na
porta da escola para deixa-lo, ele abrir a porta e sair correndo para a
lanchonete, um ritual que os autistas também desenvolvem e tem que
cumprir rigorosamente. Ocorre que ao sair do carro correndo, ele não
observava que o correto e seguro era sair pela frente do carro, pela
calçada.
Algumas vezes eu era surpreendido, enquanto desligava o carro, o Ruyzinho corria por trás, se expondo ao perigo da rua.
Certa ocasião, véspera do Dia das Mães, fomos jantar em família num
restaurante de Manaus. Ao chegarmos, tão logo estacionei e antes mesmo
que eu desligasse o carro, o Ruyzinho abriu a porta e saiu correndo por
trás. Minha mulher Kiê, se desesperou e saiu correndo também atrás dele
vindo cair no asfalto e ferindo os dois joelhos. Eu que sempre resistia
em estacionar em vagas especiais, a partir desse dia, decidi que, em
situações de perigo, não abriria mão desse direito do meu filho.
Kiê com os joelhos feridos depois de cair correndo atrás do Ruyzinho no estacionamento do restaurante
Decisão tomada, minha mulher se dirigiu ao órgão de trânsito – o
Manaustrans, levando todos os laudos do meu filho que comprovam sua
deficiência e sua condição de autista, habilitando-o a ter legalmente o
direito de estacionar em vaga especial.
Cartão do Conatran que concede ao meu filho o direito de ter o carro que o transporta estacionado em vaga especial
Insisto, vaga especial em estacionamento não é apenas para aqueles
que tem dificuldade de locomoção, como afirmou a ilustre professora da
SEMED. É para aqueles que tem alguma deficiência ou limitação que o
torne diferente das pessoas ditas “normais”. O autismo foi reconhecido
no Brasil, por lei federal, como uma das deficiências humanas.
Estacionar meu carro em vaga especial é algo que não me dá nenhum
prazer. Ao contrário, me deixa profundamente triste. Só faço uso desse
“benefício” na porta da escola do meu filho, pela proximidade da vaga
com o portão, para evitar que ele saia correndo se expondo ao perigo da
rua.
Nunca estacionei em vaga especial de shopping, nem pretendo. Quando
viajamos em família, sequer levamos conosco o cartão do CONATRAN que tem
validade em todo território nacional.
E mais, quando viajo de avião com o Ruyzinho, prefiro embarcar junto
com as prioridades (idosos, gestantes e portadores de deficiência),
pelas mesmas razões acima expostas. O autista fica impaciente nesses
ambientes com muitas pessoas. Ficar numa fila em pé, o deixa muito
agitado e, nessa agitação, ele fica esbarrando nas pessoas ao lado. Quem
não conhece o autista, acaba se irritando achando que se trata de uma
pessoa mal educada
O episódio ocorrido no Rio de Janeiro recentemente me fez tomar uma
decisão. Na hora de fazer o check-in, vou apresentar a documentação do
Ruyzinho no balcão e exigir tudo que a lei e as resoluções da Anac
preveem para as pessoas portadoras de necessidades especiais.
Não vou mais correr o risco de ser humilhado e quem sabe preso, por
pessoas estúpidas que não conhecem leis nem o direito de pessoas
especiais.
Hiperatividade e acidente doméstico: ontem ao subir
correndo uma escada em casa, Ruyzinho caiu. Levou dois pontos na boca em
plena noite de sábado.
Obrigado Rogério Carvalho"
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