domingo, 17 de março de 2013

Estacionar em vaga especial

O título abaixo deste texto que extraí de outro diário de outro menino autista, Ruy, diz que os pais estacionam às vezes, entretanto, nós aqui, pais do Cássio, estacionamos sempre, porque é um direito adquirido e quem tiver algum questionamento que vá se informar devidamente.
O texto é interessante e muito esclarecedor!!!!

 "Porque (as vezes) estaciono meu carro em vaga especial 


 Por Ronaldo Tiradentes

Outro dia uma professora municipal, deixou um recado ostensivo em minha página no Facebook. Com alguns erros de português e muito desconhecimento sobre autismo, a dita professora assim me advertiu:
“Ronaldo Tiradentes,gostaria que vc prestasse mais atencao quando fosse estaciionar seu carro na escola do seu filhote,,pois vc ESTACIONOU na vaga de deficiente FISICO,,.deficiente e aquele que tem L I M I T C O E S F I S I C A S…….KUALKER SINDROME OU DISTURBIO DE PERSONALIDADE NAO E DEFICIENTE.TUDO BEM???!!! VC DEVE DAR O EXEMPLO….COMO EU TAMBEM…..E TODOS OS SERES QUE SE DIZEM HUMANOS ..VALEU!!!!OBRIGADA PELA ATENCAO”
Ao abrir minha página no Facebook e ler o recado atrevido, como bom leonino que sou, meu sangue ferveu. O recado poderia ter sido deixado in box (internamente), mas a professora queria mesmo era aparecer, exibir “cultura e conhecimento”. De sopetão, mandei minha resposta dura:
“você é muito audaciosa de vir aqui em minha página pessoal para querer me dar lição de moral. Quem é você ?? Quem você acha que é para querer vir aqui de forma desrespeitosa querer me ofender ??? Eu não vou dar satisfação a você porque parei em vaga de deficiente. Procure a direção da escola e questione as razões pelas quais eu parei em vaga especial Sugiro também que procure o Manaustrans e pergunte porque foi concedido ao meu filho autista o direito de ter o carro que lhe conduz parado em vaga especial. Aliás, como professora, que imagino que és, lamento que você não tenha estudado o suficiente para entender as limitações de uma criança autista. Como sei que você é deficiente intelectual, em breve darei a você licões para que aprendas a respeitar os direitos de uma criança com deficiência e os constrangimentos corriqueiros a que são submetidos os familiares. Vá estudar, analfabeta!!!!!!!!!!!

Hoje, com a cabeça fria, reconheço que exagerei na resposta. Dias antes, passei com minha família, um constrangimento no Aeroporto do Galeão, também relatado aqui e sem nenhuma resposta da TAM. O Fale com o Presidente, disponível no site da empresa aérea, é só agá, puro marketing.
Ano passado, estava dentro de um taxi em Paris com meu filho autista. Sem mais nem menos, o motorista que tinha um nariz enorme e cara de árabe, passou a dar ataques de histerismo pelo fato do meu filho ter encostado o joelho por trás do assento dele. Nunca vi tanta grosseria com uma criança que sequer sabia o que estava acontecendo. Tive que ser enérgico para repelir a falta de educação do motorista de táxi. Nesse mesmo dia, outro francês empurrou o Ruyzinho pelo simples fato dele (Ruyzinho) ter espichado o pescoço para ver o joguinho que o homem manipulava no celular. Encontrei a Kiê chorando, quando voltei para encontra-los numa pracinha de Paris.
Essas situações que humilham familiares de crianças especiais, são corriqueiras.
Temos que ter paciência de Jó para evitarmos permanentes atritos no meio da rua.
Voltando ao caso da professora da SEMED que deixou-me um recado malcriado no Facebook. Prometi que daria esclarecimentos sobre as razões que me levam a estacionar, em raríssimas ocasiões, em vagas destinadas a pessoas com portadoras de deficiência.
É verdade que meu filho autista não tem dificuldade de locomoção. Ele anda e corre muito bem. Por outro lado, não é verdade que meu filho autista tenha desvio de personalidade com afirmou a professora desinformada. Autismo, nem de longe é um desvio de personalidade. Autismo é um transtorno do desenvolvimento que dificulta a interação social da criança, atrasos na linguagem etc. Uma das principais características do autismo é a hiperatividade, o que deixa a criança muito agitada, impaciente. Na maioria dos casos, são necessários remédios para deixar a criança mais calma. Meu filho toma Risperdal todas as noites. Esta é uma tarefa minha. Dou a ele, meio comprimido para que ele desacelere e durma tranquilo.
Segundo os especialistas, essa hiperatividade passa quando o autista chega na adolescência.
Outra característica do autista, é não ter noção de perigo. Se eu deixar, o Ruyzinho atravessa a avenida Djalma Batista sem olhar para os lados. Não tem ideia do que seja um atropelamento.
Já aconteceu comigo, em várias situações, de ao estacionar o carro na porta da escola para deixa-lo, ele abrir a porta e sair correndo para a lanchonete, um ritual que os autistas também desenvolvem e tem que cumprir rigorosamente. Ocorre que ao sair do carro correndo, ele não observava que o correto e seguro era sair pela frente do carro, pela calçada.
Algumas vezes eu era surpreendido, enquanto desligava o carro, o Ruyzinho corria por trás, se expondo ao perigo da rua.
Certa ocasião, véspera do Dia das Mães, fomos jantar em família num restaurante de Manaus. Ao chegarmos, tão logo estacionei e antes mesmo que eu desligasse o carro, o Ruyzinho abriu a porta e saiu correndo por trás. Minha mulher Kiê, se desesperou e saiu correndo também atrás dele vindo cair no asfalto e ferindo os dois joelhos. Eu que sempre resistia em estacionar em vagas especiais, a partir desse dia, decidi que, em situações de perigo, não abriria mão desse direito do meu filho.
Kiê com os joelhos feridos depois de cair correndo atrás do Ruyzinho no estacionamento do restaurante
Decisão tomada, minha mulher se dirigiu ao órgão de trânsito – o Manaustrans, levando todos os laudos do meu filho que comprovam sua deficiência e sua condição de autista, habilitando-o a ter legalmente o direito de estacionar em vaga especial.
Cartão do Conatran que concede ao meu filho o direito de ter o carro que o transporta estacionado em vaga especial
Insisto, vaga especial em estacionamento não é apenas para aqueles que tem  dificuldade de locomoção, como afirmou a ilustre professora da SEMED. É para aqueles que tem alguma deficiência ou limitação que o torne diferente das pessoas ditas “normais”. O autismo foi reconhecido no Brasil, por lei federal, como uma das deficiências humanas.
Estacionar meu carro em vaga especial é algo que não me dá nenhum prazer. Ao contrário, me deixa profundamente triste. Só faço uso desse “benefício” na porta da escola do meu filho, pela proximidade da vaga com o portão, para evitar que ele saia correndo se expondo ao perigo da rua.
Nunca estacionei em vaga especial de shopping, nem pretendo. Quando viajamos em família, sequer levamos conosco o cartão do CONATRAN que tem validade em todo território nacional.
E mais, quando viajo de avião com o Ruyzinho, prefiro embarcar junto com as prioridades (idosos, gestantes e portadores de deficiência), pelas mesmas razões acima expostas. O autista fica impaciente nesses ambientes com muitas pessoas. Ficar numa fila em pé, o deixa muito agitado e, nessa agitação, ele fica esbarrando nas pessoas ao lado. Quem não conhece o autista, acaba se irritando achando que se trata de uma pessoa mal educada
O episódio ocorrido no Rio de Janeiro recentemente me fez tomar uma decisão. Na hora de fazer o check-in, vou apresentar a documentação do Ruyzinho no balcão e exigir tudo que a lei e as resoluções da Anac preveem para as pessoas portadoras de necessidades especiais.
Não vou mais correr o risco de ser humilhado e quem sabe preso, por pessoas estúpidas que não conhecem leis nem o direito de pessoas especiais.
Hiperatividade e acidente doméstico: ontem ao subir correndo uma escada em casa, Ruyzinho caiu. Levou dois pontos na boca em plena noite de sábado. 
Obrigado Rogério Carvalho"

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